domingo, 14 de dezembro de 2008

Vender pela diferença - a publicidade "negativa" e a Pepsi

Atribuir o conceito de obra de arte a um anúncio publicitário pode parecer heresia, artisticamente falando, mas, cada vez mais, se assiste a uma implementação de uma publicidade criativa que procura fugir à mera comercialização do produto.
A publicidade de tão abundante tornou-se banal e há que primar pela diferença. O apelo ao consumo feito através de imagens belas, apelativas, suculentas – no caso da comida – está a tornar-se obsoleto e começam a utilizar-se estratégias que, nalguns casos, primam pelo choque com o normal conceito publicitário.
A Pepsi é um dos exemplos em que a evolução da publicidade se torna por demais evidente. Até há poucos anos, a Pepsi estava associada a um ideal de beleza. Cindy Crawford, as Spice Girls, Britney Spears ou David Beckham, figuravam nos anúncios que faziam um claro apelo ao consumo aliado à imagem. Num anúncio antigo (que pode ser visto aqui), do qual não consegui obter a data, a garrafa de Pepsi é mesmo comparada com o corpo de Cindy Crawford, a diferença é que a supermodelo só pode ser «nossa» em sonhos…
Este tipo de publicidade tem o objectivo de passar uma imagem positiva do produto e suscitar empatia no consumidor, mas, actualmente, já não introduz qualquer novidade. A Pepsi parece ter percebido isso e os novos produtos da marca têm campanhas que primam pela diferença.
A Pepsi Twist, por exemplo, apresenta-nos dois irreverentes limões, que não geram sentimentos de empatia. A forma como adicionam o aroma do fruto à Pepsi (clicar aqui para ver), não cria vontade de consumi-lo. A imagem de um ser que urina para dentro de um copo do produto que se quer vender, aparentemente, não interessaria à marca. No entanto, a campanha prima pela diferença e pelo corte com o que se costuma fazer em relação a outros anúncios de refrigerantes.
Se o caso da cola com sabor a limão é incaracterístico, uma das campanhas publicitárias da Pepsi Max rompe com tudo o que já foi feito até agora – que eu conheça - para vender um produto. A Pepsi Max é uma cola que só tem uma caloria, é light portanto. Que melhor maneira de promover um refrigerante light que com o escultural corpo de uma rapariga teenager? A Pepsi não pensou assim, foi mais longe, e realçou o ponto mais negativo que um produto de uma só caloria pode ter – o isolamento social do elemento calórico.
O que mostra a publicidade são os desenhos de um ser desesperado para colocar fim à vida dentro de uma lata de Pepsi (clicar aqui, aqui e aqui). A ideia que transmite não poderia ser mais negativa. A caloria não é esbelta ou limpa e o melhor sentimento que se pode ter em relação a ela é de pena. Além de tudo isto, as imagens são violentas e associam a marca ao suicídio. Era um anúncio viável há 5 anos? Talvez não. Mas a publicidade está a mudar e o sentimento que se pretende criar nos consumidores também.
Quer marcar-se pela diferença e pela irreverência, nem que para isso sejamos induzidos a imaginar um castor a contribuir para o suicídio de uma caloria no interior de uma lata de Pepsi. Se publicidade pode ser arte é discutível, mas há casos em que um génio criativo superior está presente e isso é indiscutível.

3 comentários:

Rosa Vieira Guedes disse...

Só para deixar um provocação para atear a discussão sobre o teu post que deixa muito que pensar...Uma citação de Susana Sontag: "the culture of entertainment is the most cruel lobotomy practice on the thinking of our civilization".

André Mantas disse...

Bom, vendo os exemplos de alguns anúncios publicitários, penso que a discussão sobre a sua categorização como arte ou não, fica com pouca margem para dúvidas. Tanto que muitos cineastas (portanto, com formação artística)começam a carreira como publicitários. Veja-se por exemplo o caso de David fincher, que publicitou marcas como a Coca-cola, Nike, ou Hewlett-Packard. Aqui, exemplo do seu anúncio para a nike;(http://cinemanotebook.blogspot.com/2008/11/nike-aos-olhos-de-david-fincher.html)
O exemplo deste realizador, e muitos outros,não nos fazem duvidar que constroem o anúncio aliando os objectivos comerciais à arte.
Interessante também a questão da adaptação aos tempos, ao consumidor. Penso até que cada vez mais a publicidade (a boa publicidade...), procura exactamente na arte e nas técnicas e linguagem cinematográficas um veículo para chegar mais depressa ao consumidor, independentemente das mudanças de conceito verificadas ao longo dos tempos.

Gabriela Borges disse...

As grandes marcas estão mesmo sempre a inovar!!! Têm uma sólida imagem construída e podem sempre apostar em novos discursos comunicacionais. É genial o anúncio da Pepsi Max e muito criativos os recursos gráficos usados nos anúncios mais recentes.
Quanto à discussão se publicidade é arte ou não, esta não é nada nova, ainda mais porque os primeiros publicitários eram artistas, uma vez que a profissão não estava estabelecida.
No Brasil houve uma grande polêmica a este respeito quando o filme Cidade de Deus foi lançado, pois os profissionais vinham do mercado publicitário e estavam estreando no cinema. Portanto a linguagem utilizada tinha todo um bonito "look" publicitário.
Acho que o mais importante em tudo isso é a intersemioticidade entre as várias linguagens, as quais contribuem não apenas para a produção de ideias criativas como também para a irreverência dos discursos, sejam eles publicitários, cinematográficos, artísticos ou não.